terça-feira, 22 de novembro de 2011

Comissão da Câmara dos Deputados censura Comparato



Texto de José de Souza Castro:

A Comissão de Ciência, Tecnologia, Informática e Comunicação da Câmara dos Deputados cancelou a audiência pública convocada para a discussão do escandaloso arrendamento de concessões de rádio e televisão no país. O professor Fábio Konder Komparato, autor da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) que deu entrada no Supremo Tribunal Federal em outubro do ano passado, deveria falar nessa comissão.

Reagindo a essa espécie de censura ao seu pronunciamento, Comparato divulgou nesta segunda-feira, num blog, o texto da palestra que faria à comissão.

O convite a Comparato foi feito pela Comissão por insistência de um de seus membros, a deputada Luiza Erundina (PSB-SP). Primeiro, a Comissão comunicou a Comparato que ele deveria pagar sua própria passagem aérea de São Paulo a Brasília. Erundina protestou e a Comissão concordou em pagar a passagem. Mas em seguida cancelou a audiência pública.

Essa Comissão é formada por 43 deputados de 19 partidos e o mesmo número de suplentes. São muito, e não é por causa do interesse deles em ciência, tecnologia e informática. O que os movem, em sua maioria, são o rádio e a televisão. O presidente, o primeiro e o terceiro vices-presidentes são tucanos e o segundo vice-presidente do PSD. São eles, respectivamente, Bruno Araújo (PE), Antonio Imbassahi (BA), Ruy Carneiro (PB) e Silas Câmara (AM). Para vergonha dos mineiros, fazem parte da comissão os deputados Gilmar Machado (PT) e Rodrigo Castro (PSDB), além dos suplentes Eduardo Azeredo (PSDB), Paulo Abi-Ackel (PSDB), Renzo Braz (PP), Fábio Ramalho (PV) e Mário de Oliveira (PSC).

Segundo Comparato, “neste país, desde o início do regime empresarial-militar em 1964, ou seja, antes mesmo da difusão mundial do neoliberalismo capitalista nas duas últimas décadas do século passado, instaurou-se o regime da privatização dos serviços de rádio e televisão. A presidência da República escolheu um certo número de apaniguados, aos quais outorgou, sem licitação, concessões de rádio e televisão. Todo o setor passou, assim, a ser controlado por um oligopólio empresarial, que atua não segundo as exigências do bem comum, mas buscando, conjuntamente, a realização de lucros e o exercício do poder econômico, tanto no mercado quanto junto aos Poderes Públicos. Ainda hoje, todas as renovações de concessão de rádio e televisão são feitas sem licitação. Quem ganha a primeira concessão to rna-se “dono” do correspondente espaço público.”

Se quisessem fazer coisa melhor do que renovar ilegalmente concessões de rádio e TV, poderiam apresentar ao Congresso Nacional propostas de regulamentação de artigos da Constituição de 1988. Aliás, era isso o que queria Comparato, quando propôs há mais de um ano a ADIN. Íntegra AQUI.

Os interessados podem ler as ponderações de Comparato nos endereços citados. Mas acho importante transcrever mais um trecho da palestra que ele não fez na tal Comissão:

“Qual não foi, porém, meu desencanto quando, intimados a se pronunciar nesses processos, tanto a Câmara dos Deputados, quanto o Senado Federal, tiveram a audácia de declarar que não havia omissão legislativa alguma nessa matéria, pois tudo transcorria como previsto no figurino constitucional! Acontece que, para cumular o absurdo, a duplicidade no campo da comunicação social não se reduz apenas ao apontado descompasso entre a Constituição e as leis. Se considerarmos em particular o estatuto da imprensa, do rádio e da televisão, encontraremos o mesmo defeito: o direito oficial é afastado na prática, deixando o espaço livre para a vigência de um direito não declarado, protetor dos poderosos.”

Para encerrar, um diálogo transcrito por Comparato no começo de sua palestra, encontrado em “Memórias de um Sargento de Milícias”, escrito por Manoel Antonio de Almeida, em forma de folhetim, entre 1852 e 1853.

“– Bem sei, mas a lei?

– Ora, a lei… o que é a lei, se o Senhor major quiser?…

O major sorriu-se com cândida modéstia.”

Passados 160 anos, a lei é o que eles quiserem. Eles são os ricos e os poderosos.

Fonte: Blog Kikacastro

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