Ontem fiquei o dia inteiro no Hotel Braston participando do seminário do PT que reuniu aproximadamente 20 entidades para discutir o marco legal das comunicações. Segundo meu amigo Altamiro Borges, presidente do Barão de Itararé, foi um dia histórico. Na avaliação a dele, entrada do PT com sua força social e parlamentar na construção de uma proposta para regulamentar o setor modifica a correlação de forças e dá novo gás ao movimento pela ampliação da democratização na área.
Aliás, destaque necessário, Miro e Renata Mielle, que são do PCdoB, acompanharam o seminário do seu primeiro ao último minuto. Como também o fez o presidente do PT, Rui Falcão. Ele não arredou pé do plenário, anotou trechos de falas, interveio quando achou conveniente e disse que considera importante que se construa uma campanha para debater o tema no ano que vem.
A ausência de representantes do ministério das Comunicações no evento, em especial do ministro Paulo Bernardo, foi o fato a lamentar. Bernardo tem assumido uma posição de distanciamento estranha e desnecessária com o campo que defende o debate do marco legal e um PNBL mais amplo e menos teles. Enquanto tem se reunido constantemente com o mercado, desmarcou o último encontro agendado com o movimento social do setor e nunca mais tratou de remarcá-lo.
No evento de ontem, apresentei pela Altercom, em conjunto com João Brant, do Intervozes, um estudo sobre a legislação de comunicação de quatro países: EUA, França, Reino Unido e Portugal.
Levantamos os seguintes aspectos dessas legislações: 1) Arquitetura institucional; 2) Princípios e objetivos; 3) Concentração; 4) Sistema público e mídias comunitárias; 5) Pluralismo e 6) Diversidade; 7) Proteção de Direitos. Esse estudo teve por objetivo mostrar que a legislação brasileira é não só atrasada, como também pontuar que o que estamos debatendo no Brasil não tem nada de revolucionário ou muito menos tem qualquer intenção de controlar ou censurar a mídia. É algo que outros países de legislação de inspiração liberal já adotam. Segue o estudo que foi baseado num documento anteriormente preparado pelo Intervozes e nos depoimentos de representantes desses países no seminário de Convergência de Mídias que aconteceu, em dezembro de 2010, em Brasília.
Antes, porém, como fui um dos que contribuiu na organização deste seminário, queria agradecer a todos que foram ao evento, em especial aos palestrantes, e destacar o importante papel que teve o meu amigo Glauber Piva para que o evento acontecesse.
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EUA, Reino Unido, França, Portugal e suas legislações de comunicação
1) Arquitetura institucional
Estados Unidos – FCC – agência única para radiodifusão e telecomunicações.
Reino Unido – Ofcom – agência única para radiodifusão e telecomunicações e vários mecanismos de participação social. Tem uma comissão só para tratar de conteúdo.
França – Tem duas agências. ARCEP (telecomunicações) que faz a regulação concorrencial e distribuição de frequências. E a CSA, que trata de missões sociais e culturais sobre os conteúdos audiovisuais (no caso de um conjunto organizado de imagens e sons acessíveis ao conjunto do público a um mesmo momento – excluindo sempre conteúdo gerado pelo usuário) e competência econômica de regulação.
Portugal – Também tem duas agências. Anacom (telecomunicações) e ERC (comunicação social – incluindo qualquer plataforma).
2) Princípios e objetivos
Estados Unidos
Regular comunicações interestaduais e internacionais do país, seja por rádio, televisão, cabo, satélite e redes telemáticas.
Assegurar o fornecimento universal de serviços básicos de comunicação tornando-os acessíveis a todas as pessoas.
Fazer cumprir as leis, emitindo normas infralegais e aplicando sanções nas empresas concessionárias.
Reino Unido
Disponibilizar em todo o Reino Unido de serviços de rádio e televisão que primem pela qualidade e variedade de gostos e interesses.
Manutenção de uma pluralidade suficiente de fornecedores de diferentes serviços de televisão e rádio.
Aplicação, no caso de todos os serviços de rádio e televisão, de normas que assegurem uma proteção adequada aos cidadãos quanto à veiculação de conteúdo ofensivo e prejudicial.
Aplicação, no caso de todos os serviços de rádio e televisão, de normas que assegurem uma proteção adequada ao público, seja no que se refere ao tratamento injusto em programas e também no que diz respeito à violação injustificada da privacidade.
França
Monitora o respeito ao pluralismo político e sindical sobre as antenas.
Deve assegurar a proteção dos espectadores e ouvintes jovens.
3) Concentração
Estados Unidos – Uma pessoa não pode possuir uma estação de radiodifusão (rádio ou TV) e um jornal diário quando o serviço da estação de TV cobre a cidade de publicação do jornal.
Reino Unido – Nenhuma pessoa pode manter, ao mesmo tempo:
Uma licença de rádio analógico local;
Uma licença de um dos principais canais privados de TV cuja audiência potencial inclua 50% da audiência do serviço de rádio analógico; e
O maior jornal local.
França – Uma série de regras cruzando audiência, alcance e propriedade.
Propriedade cruzada – Ninguém pode deter mais que duas das seguintes posições:
Ter licenças de TV que alcancem mais de 4 milhões de pessoas
Ter licenças de rádio com audiência potencial maior que 30 milhões
Ser editor ou proprietário de jornais diários com participação de mercado de mais de 20%
Portugal – Forte controle de aquisição de direitos exclusivos. Estabelece tipos de licença: internacional, nacional, regional ou local.
4) Sistema público e mídias comunitárias
Estados Unidos – Reserva 25% do espectro para mídia pública e permite que emissoras comunitárias ocupem espaços vazios no espectro.
Reino Unido – Dá espaço considerável para rádios comunitárias, com alcance de até 5 km, pode ter até 50% de verbas oriundas de publicidade.
França e Portugal – Regras específicas para o sistema público, forte financiamento, conselhos de programação, pluralidade.
5) Pluralismo
Estados Unidos – Manteve por décadas a ‘fairness doctrine’, que impunha equilíbrio na cobertura de temas de interesse público. Esta lei caiu durante o Governo Reagan.
Portugal – Rigor e existência de contraditório, direito de resposta, direito de antena e direito de réplica política.
Reino Unido – Exige a devida imparcialidade e a devida precisão no jornalismo praticado em meios sob concessão pública. Impede indevida proeminência de pontos de vista e opiniões.
França – Busca honestidade e equilíbrio de pontos de vista e opinião. Conta tempo dedicado às falas da oposição e define equilíbrio de cobertura de acordo com representatividade. Televisões e rádios devem respeitar a expressão pluralista de correntes de pensamento e opinião. A oposição não pode ter menos da metade das falas dedicadas à base do governo nas mídias. E prevê direito de antena para organizações sociais.
6) Diversidade
Estados Unidos – Praticamente não há. Isso também se explica porque os EUA não tem problema com a invasão de produções culturais estrangeiras.
França – Tem cotas de programas para filmes franceses e europeus. Leva em consideração para o que vai ao ar a diversidade de origens e de culturas da comunidade nacional.
Reino Unido – Cotas para produções europeias. Promove equidade de oportunidades nas áreas de deficiência, gênero e raça. Promove diversidade, inclusive linguística, entre Inglaterra, Escócia, Gales e Irlanda do Norte.
Portugal – Cotas de produção europeia e de produção independente. Estabelece uma série de obrigações e estímulos nos cadernos de encargos das licenças.
7) Proteção de direitos
Estados Unidos – Restringe-se ao controle de transmissão de material impróprio (indecente, obsceno, etc.).
Portugal – A proteção de crianças e adolescentes, de direitos de personalidade (reserva da vida privada e da intimidade, direito à honra, etc.) e de grupos minoritários. Não permite incitação ao ódio racial, religioso, político ou gerado pela cor, origem étnica ou nacional, pelo sexo ou pela orientação sexual.
Reino Unido – Proteção de menores de 18 anos; danos e ofensa; crime; justiça e equidade; privacidade; patrocínio; temas comerciais. Proteção aos indivíduos e organizações afetados por um programa (entrevista, participação etc.). Proteção de raça, gênero e nacionalidade.
França – Protege a infância e a adolescência e também contra discriminação de raça, gênero, religião ou nacionalidade.
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