O atual contexto histórico impõe a urgência das medidas que serão adotadas
Fernando Pimentel*
Ontem, a presidente Dilma Rousseff lançou o Plano Brasil Maior, a nova política industrial, tecnológica e de comércio exterior do governo federal. Mais do que um slogan de lançamento, inovar para competir, competir para crescer, este é um desafio colossal. As experiências bem-sucedidas de nações que alcançaram um estágio superior de desenvolvimento evidenciam dois importantes ensinamentos, que o Brasil deve ter atenção.
O primeiro é que a história de cada país é formada pelas próprias mãos de seu povo. Não existe, portanto, um modelo de desenvolvimento ideal a ser seguido, como propõe o liberalismo econômico e suas variadas matizes contemporâneas, nas quais se supõe que o caminho do desenvolvimento se dá por um conjunto normativo de conduta racional dos agentes econômicos objetivando o bom funcionamento do mercado e a superação de suas falhas. A crença cega no sistema de preços como mecanismo de autorregulação do mercado tem sido o pomo da discórdia das teorias econômicas, desde o século XIX. Como amplamente evidenciado na historiografia de formação dos mercados nas nações ainda hoje hegemônicas (vide Marx, Polanyi e Braudel), a introdução da moeda, a criação do sistema de preços e o desenvolvimento da economia monetária são construções sociais, surgidas de conflitos antagônicos em geral superados pelo uso da violência e outras formas não canônicas de conduta dos agentes econômicos.
Nesse sentido, o mercado foi construído pela capacidade dos Estados Nacionais instituírem a ordem econômica, começando pela imposição do curso legal da moeda. Ao contrário do imaginário corrente, as trajetórias bem sucedidas de industrialização não foram o resultado natural do funcionamento da mão invisível e sim produto dos esforços dos povos na construção de modernos estados nacionais, com poder de comando sobre o território.
O esforço da inovação será alavanca decisiva na estratégia do salto da nossa indústria rumo ao futuro
O segundo importante ensinamento da história contemporânea das nações é o papel central do conhecimento científico e tecnológico. O que já se sabia sobre o poder social e econômico do conhecimento nas antigas civilizações (orientais e ocidentais) foi imensamente amplificado com o surgimento da indústria fabril como motor da produção material. A entrada no novo milênio significou o terceiro século da civilização sob o domínio do sistema fabril de produção. As quatro revoluções tecnológicas que se sucederam trouxeram em escala crescente o conhecimento para o comando operacional do sistema fabril. Os chamados sistemas embarcados são a expressão maior desse processo, no qual o computador é completamente encapsulado ou dedicado ao dispositivo ou sistema que ele controla. Pela engenharia mecatrônica pode-se otimizar o projeto reduzindo tamanho, recursos computacionais e custo do produto. A próxima revolução será a difusão da impressora em três dimensões diretamente no processo de produção, trazendo a possibilidade de ganhos de produtividade pela produção flexível, o que mudará definitivamente os parâmetros de retornos crescentes pela lei secular da escala e escopo.
Essas inovações radicais no sistema fabril poderão, paradoxalmente, ser aceleradas pela profundidade e extensão da atual crise econômica mundial. A busca de um novo ciclo de ganhos sustentáveis de produtividade, agora sob a pressão ambiental, pode mais uma vez ser o caminho de inflexão da crise e de retomada da expansão econômica. Como em outras crises sistêmicas da economia monetária mundial, a destruição criadora revigora uns e aniquila outros. Na última crise dessa natureza, a grande depressão de 1929, o Brasil saiu melhor do que entrou. Como nos ensinou Celso Furtado em sua Formação Econômica do Brasil, a ação deliberada do Estado foi então decisiva para que o país conseguisse se integrar ao ciclo de industrialização e expansão econômica mundial que se seguiu.
O atual contexto histórico impõe a urgência das medidas que serão adotadas. O grande desafio do Brasil é se preparar para um novo salto da produtividade do trabalho via inovação tecnológica, de tal forma a mudar nossa posição competitiva num mundo em profunda transformação. De um lado, as economias capitalistas mais avançadas mergulhadas na crise, e de outro um grupo de países emergentes, liderados pelo extraordinário crescimento chinês.
O Plano Brasil Maior é uma resposta contemporânea de política de desenvolvimento produtivo a este grande desafio do salto de produtividade. Com um parque manufatureiro e uma rede de serviços avançados, e um sistema de ciência e tecnologia com escala e densidade significativas, a arma principal do país contra o acirramento da competição e apreciação cambial de nossa moeda é explorar as forças conquistadas no período recente, a estabilidade e a retomada do investimento e do crescimento. Mercado grande e em expansão, poder de compras públicas, extensa fronteira de recursos energéticos, força de trabalho jovem e capacidade empresarial constituem ativos institucionais, físicos e sociais formidáveis. Para colocar tais forças em movimento na velocidade exigida, o esforço da inovação será alavanca decisiva na estratégia do salto da nossa indústria, rumo ao futuro.
*Fernando Pimentel é ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior
Publicado no jornal Valor Econômico em 03 de agosto de 2011
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